terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Vaca profana: Encruzilhadas, Rogério Amaral de Vasconcellos


Vaca profana: EncruzilhadasRogério Amaral de Vasconcellos. 82 páginas. Prefácio de André Carneiro. Coleção Slev, Fase 1, nº zero.
Edição do autor, Rio de Janeiro, 2005.

O projeto Slev é conhecido pelos leitores brasileiros de ficção científica, pois é o projeto literário mais extensivo do escritor-fã carioca Rogério Amaral de Vasconcellos, colaborador frequente dos principais fanzines brasileiros de ficção científica e fantasia. Vasconcellos é formado em física e estreou em 2000 com o romance Campus de Guerra, pela Editora Writers.
A princípio, a sigla Slev significou "Suruba Literária Experimental Virtual", uma oficina de literatura criativa com foco de ação na internet, a partir de um saite que aglutinava vários escritores amadores. Em 2001, o projeto publicou seu primeiro livro, Idade da decadência: Inferno em Khallah, um romance em edição por demanda assinado por Vasconcellos e mais quatro autores, cujos manuscritos foram discutidos em conjunto dentro do projeto.
Depois disso, a Slev foi rebatizada para "Sistema Literário Experimental Virtual" e, também a partir da internet, iniciou outra fase de criação, propondo aos seus autores filiados um universo compartilhado com viagens no tempo e no espaço. Os resultados dessa atividade foram publicados pela Slev a partir de 2003, com nada menos que trinta volumes em edição virtual ­– os conhecidos e-books –­ sendo que os dois últimos saíram no início de 2005.
Vaca profana: Encruzilhadas, é o primeiro título dessa coleção a ganhar edição física convencional, em papel. Junto com o segundo título ­Vaca profana: A nave – só disponível em formato virtual – ­ forma a introdução básica que foi primariamente apresentada aos autores do projeto e que definiu personagens e parâmetros com os quais todos deveriam trabalhar. Nessa introdução, Vasconcellos apresenta doze personagens principais que apareceram sozinhos ou em grupo nas histórias que foram escritas posteriormente, sendo que em Vaca profana: Encruzilhadas, são apresentados seis deles.
O primeiro é Benedito Raimundo Alves da Silva, um bem sucedido corrupto brasileiro que, ao perceber que seu esquema está prestes a ser desmontado pela Polícia Federal, embarca num voo só de ida para Miami. Porém, no meio da viagem, percebe que algo estranho aconteceu com os demais passageiros: não são mais os mesmos que embarcaram com ele e o próprio avião é diferente. Num jornal ele descobre que não está mais em 2000, mas um ano adiante, mais exatamente no mês de setembro de 2001. Com a aeromoça ele se informa que o voo, um avião da American Airlines, não vai mais para Miami. Na verdade, ele não irá para parte alguma...
Depois conhecemos Nahed Al-Shamalia, indiano, navegador estelar comissionado na espaçonave Altamira em 2285, em missão no espaço profundo, que passa a ser acometido por delírios em torno de seu pênis, numa fantasia erótica de proporções cosmológicas.
Também somos levados ao planeta Giron'dha, no sistema Epsilon-Eridani. Ali vive uma raça de sencientes vegetais, entre os quais destaca-se a fêmea plebéia Zandra de Harboor, chefe de um projeto científico importante, que desperta a inveja do grão-duque Alguroom de Refroom. Este planeja e põe em prática um esquema maquiavélico para livrar-se dela e, ao mesmo tempo, herdar seu prestígio e poder.
Finalmente, conhecemos o criacionista russo Dimitri Diogovitch Rosenkovski e o evolucionista grego Andreas Nikolos Papandriou, arqueólogos rivais que discutem calorosamente durante uma escavação no deserto de Gobi, na Mongólia, em 1866. Eles mal têm tempo de reagir quando percebem-se atacados por uma manada de animais desconhecidos, verdadeiros elos perdidos na escala da evolução. As feras são predadoras e estão famintas...
Os fragmentos não chegam a se concluir e são alinhavados frouxamente por um interlúdio final que nos apresenta o Barqueiro e o Zelador, seres de origem desconhecida que cuidam das celas em que os abduzidos estão confinados. Onde, para quê e por quê não se esclarece neste volume, o que parece ser uma estratégia do autor para motivar a criatividade dos colaboradores do projeto Slev.
Como se vê, Vaca profana:­ Encruzilhadas tem ideias boas e o texto de Rogério Amaral Vasconcellos apresenta correção técnica e algum estilo, entretanto é pesado e difícil de ler. A narrativa sincopada repleta de derivações, que também caracteriza outras obras do autor, exige muito do leitor, tornando a leitura lenta e sem variações de ritmo. Esse estilo é muito utilizado por autores introspectivos e funciona bem em narrativas estáticas com solilóquios ou monólogos, mas prejudica as cenas de ação, que Vasconcellos usa com frequência.
Vaca profana:­ Encruzilhadas foi publicado ainda no primeiro semestre de 2005 e, desde então, Rogério Amaral de Vasconcellos não anunciou mais nenhum outro título da coleção no formato convencional, mas sabe-se que há interesse do autor em levar às livrarias todos os trinta volumes publicados virtualmente.
Cesar Silva

Nenhum comentário:

Postar um comentário