domingo, 18 de janeiro de 2015

Horror em Red Hook, H. P. Lovecraft


Horror em Red Hook (The horror at Red Hook), H. P. Lovecraft. 64 páginas. Tradução de Jorge Ritter. Capa de Ivan Pinheiro Machado. Editora L&PM, Porto Alegre, 2012.

Em 2011, a editora L&PM criou uma nova coleção dentro de sua tradicional linha de livros de bolso, a Coleção 64 Páginas, que é exatamente isso, livros de bolso com exatas 64 páginas, oferecidos ao custo de R$5,00, proposta que eu aprecio em todos os sentidos. Primeiro pelo potencial de levar literatura de baixo custo a uma ampla faixa de consumidores, depois porque dá oportunidade de destaque a contos e noveletas que, geralmente, desaparecem em meio aos romances e antologias. Há muita ficção curta tão bem feita que merece um título só para si, e a Coleção 64 Páginas, tal como a coleção Asas do Vento, da Devir, investe especificamente nesse espaço.
A Coleção 64 Páginas estreou com uma coletânea de tiras do Maurício de Sousa, mas publica principalmente literatura em domínio público. Entre os autores presentes nos volumes iniciais estão, por exemplo, Fernando Pessoa, Arthur Conan Doyle, Tolstói, Balzac, Machado de Assis, Edgar Allan Poe e H. P. Lovecraft, cujo título Horror em Red Hook, publicado em 2012, não resisti ler de imediato. Trata-se de uma pequena coletânea com três contos deste mestre do horror, todos já vistos em A tumba ...e outras histórias, publicada em 1991 pela Francisco Alves. Nada de novo, portanto, mas eu me vi envolvido pela leitura como se fosse a primeira vez, ao ponto de acreditar que pelo menos o "Horror em Red Hook" fosse inédito. Talvez a sensação seja mérito da nova tradução de Jorge Ritter - na edição da Francisco Alves era de Sylvio Gonçalves - mas o fato é que a força do texto não perdeu nada de seu impacto.
O que caracteriza esta seleção é a escolha de textos na fronteira entre o terror psicológico e o sobrenatural. "Horror em Red Hook", que abre a seleção, pode ser perfeitamente lida como uma história policial que se densenrola em um bairro decadente, pobre e violento de Nova York, onde amontoam-se imigrantes estrangeiros. Um detetive, que investiga crimes cometidos na região, desconfia do envolvimento de um figurão, descendente de uma família fundadora da cidade, que apresenta um comportamento esquisito e não tem dificuldade de se relacionar com os estrangeiros do bairro, sempre descritos da pior forma possível. As revelações da investigação são tão terríveis que levam o policial à beira da psicose, embora não se saiba ao certo se o que ele testemunhou foi real ou apenas um delírio. O que impacta no texto é o altíssimo nível de xenofobia e intolerância contra os estrangeiros, especialmente árabes e orientais, que Lovecraft não maquiou de forma alguma.
"Ele" é o texto mais lisérgico da seleção, sobre o passeio emocional que um homem dá por bairro de Nova York que ainda sustenta ruas e casas de tempos passados. A certa altura, ele encontra um outro homem de interesses similares, que o convida para uma excursão especial e o conduz por um caminho que parece levá-los centenas de anos de volta no tempo.
Finalmente, "A tumba", um conto clássico do autor, conta sobre a fixação de um jovem pelas ruínas de um antigo túmulo abandonado no meio da mata, construção sobrevivente de uma tragédia ocorrida muito tempo atrás.
A coletânea, por não dispôr do horror cosmológico que caracteriza os textos sobrenaturais de Lovecraft, ressalta sua técnica literária, que muitos classificam como extravagante e exageradamente adjetivada, mas também expõe com nitidez a melancolia do autor ao ver a memória e a beleza arquitetônica do passado sendo devoradas pelos avanços da modernidade, da tecnologia e, principalmente da maldade humana.
Horror em Red Hook é um bom volume para iniciar o leitor nos labirintos da obra lovecraftiana, uma ótima introdução aos horrores indizíveis do Cavalheiro de Providence.
Cesar Silva

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