sábado, 30 de março de 2019

Mistério de Deus, Roberto de Sousa Causo

Mistério de Deus, Roberto de Sousa Causo. 600 páginas. Devir Livraria, São Paulo, 2017.

Há anos esperava que o meu amigo Roberto de Sousa Causo trouxesse à luz a história de Mistério de Deus, do qual fui leitor beta. A espera acabou em 2017, com o lançamento do romance pela Devir Livraria.
Mistério de Deus não é continuação nem spin-off de Um anjo de dor, romance de horror de Causo publicado em 2009 pela mesma Devir Livraria. Mas há pontos de contato entre as duas histórias, a começar pelo cenário de Sumaré, cidade no interior paulista onde o autor passou boa parte de sua juventude.
Tenho na memória, muito nitidamente, a maioria das cenas do romance, que conta a história de um ex-presidiário, leão de chácara num inferninho de Sumaré nos idos de 1991, que é levado pelas circunstâncias e por um profundo senso de justiça, a intervir nas ações de um grupo criminoso que aterroriza a região a bordo de um maverick preto envenenado. Mas não é só isso, há algo sobrenatural em torno das ações do bando, e o rapaz vai ter que levar sua determinação ao limite para tirá-los de cena.
A história tem um contorno realista que dialoga com um modelo literário que está muito em voga, como o do romance vencedor do prêmio São Paulo de Literatura Barba ensopada de sangue, de Daniel Galera (Companhia das Letras, 2012), um drama policial de contornos regionalistas que aos poucos assume os protocolos das histórias de horror.
Seguindo as orientações de mestres do gênero, especialmente Stephen King, Causo não se furta a mostrar a cara do monstro no momento adequado e com toda a crueza possível. Porém, a elegância narrativa não permite que a história assuma caminhos demasiadamente apelativos, com sangue e tripas espirrando na cara do leitor, como seria de se esperar no estilo brutalista tão popular no gênero atualmente.
O livro tem 600 páginas – é provavelmente o livro mais volumoso já publicado pelo autor – e traz na capa uma ilustração agressiva de Vagner Vargas, que tem sido parceiro constante de Causo em suas publicações.
Roberto de Sousa Causo é Doutor em Letras pela Universidade de São Paulo e mantém um intensivo trabalho como autor de ficção especulativa, com diversos livros de ficção e não ficção publicados no Brasil – alguns deles premiados – e dezenas de contos publicados no exterior em países como Portugal, Argentina, França, China e Cuba. Entre seus trabalhos mais importantes, está o ensaio Ficção científica, fantasia e horror no Brasil – 1875 a 1950 (UFMG, 2003).
Mistério de Deus vai agradar vários tipos de público: desde o leitor de horror, que é óbvio, mas também os de histórias de mistério policial e principalmente os fãs de muscle cars, um público ainda pouco explorado pela literatura nacional.

sábado, 23 de março de 2019

O Terror


O Terror (The Terror: A Novel), Dan Simmons. Tradução de Alexandre Martins. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2017. 751 páginas. Lançamento original em 2007.


Em 1845 partiram da Inglaterra os navios HMS Erebus e o Terror da Marinha real com o objetivo de descobrir e atravessar a Passagem Noroeste, que liga os oceanos Atlântico e Pacífico através do Círculo Polar Ártico, situada no extremo norte do Canadá.
A chamada Expedição Franklin, nome dado por causa do comando do capitão Sir John Franklin, do Erebus, contava com uma tripulação de mais de cem homens, equipamentos modernos e provisões para cerca de três anos. Estavam, portanto, preparados para a travessia e a viagem pelo Pacífico adentro. Mas tiveram o infortúnio de serem surpreendidos por um inverno rigoroso fazendo com que os dois barcos ficassem encalhados em meio a massas de gelo colossais e temperaturas dezenas de graus abaixo de zero.
O enorme romance, de mais de 700 páginas que retrata um dos acontecimentos históricos mais dramáticos da Marinha real britânica, é narrado de forma não linear, entremeando os capítulos num vai e vem, entre o início da expedição e o drama que passam a viver quando os navios encalham. Apenas mais ou menos da metade em diante a história assume uma linha narrativa mais convencional, embora sempre abordada do ponto de vista de um personagem, que recebe o nome do capítulo. E é por meio deste recurso que a história é contada principalmente através do capitão Francis Crozier, do Terror, que é quem de fato assume o comando da expedição após a morte do capitão Franklin, em meados de 1847. Outro personagem interessante é o Dr. Goodsir, que relata em um diário tudo aquilo que sente e testemunha, principalmente do ponto de vista médico. Assim, o nível dos detalhes dos problemas que enfrenta, como doenças e cirurgias são bastante detalhados e às vezes indigestos para quem não está acostumado a lidar com situações deste tipo. Esta escolha do autor dá ao livro uma perspectiva mais particular do drama geral, ganhando em verossimilhança das situações e intimidade com os personagens, tornando-os quase como confidentes junto ao leitor.
Chama a atenção também o grau profundo e bem documentado com que Simmons narra o drama naval, com muitas informações e detalhes sobre a rotina dos navios, suas características de trabalho e funcionamento, bem como das funções de cada tripulante. Mas, acima de tudo, do clima atmosférico tenebroso – sim, esta é a melhor palavra que encontro – que se instaura na vida dos cento e poucos homens. Frio extremo, escuridão que dura meses, alimentos de má qualidade e estragados, ferimentos e doenças em profusão, racionamento do carvão que mantém os navios minimamente aquecidos, e uma moral cada vez mais baixa entre os tripulantes, o que só torna o convívio mais tenso e perigoso, inclusive para a linha de comando.
Este drama durou três invernos e com a perda do Erebus, que afundou parcialmente, e a constatação de que o Terror teria poucas chances de voltar a navegar mesmo com um degelo, as tripulações dos dois navios partem rumo ao sul (arrastando sobre a neve trenós e pequenos barcos), para tentar encontrar uma saída para sobreviverem.
Como já dá para perceber este drama já é, por si, terror. E ainda mais pungente quando sabemos que tudo isso ocorreu de verdade. Mas a este contexto o autor acrescenta seu toque ficcional, tornando a história algo mais do que um romance histórico competente. Pois os homens são também aterrorizados pela presença de um monstro, quase invisível, pois é branco como a neve, e que fica à espreita e só aparece no momento final do ataque, quando é tarde demais. Descomunal, tem quatro metros de altura e por ser muito parecido com um urso polar, confunde ainda mais suas vítimas.
A fera, que surgiu não se sabe de onde, circunda os navios e costuma atacar quando os tripulantes têm de sair deles por alguma razão. Mas aos poucos também começa a atacar as embarcações, matando com muita facilidade e devorando suas vítimas. Sim, ela adora carne humana.
Embora não afirme nos “Agradecimentos” é possível aludir que Simmons se inspirou no conto clássico “Quem Anda Aí?[1] (“Who Goes There?”, 1938), de John W. Campbell, Jr., adaptado três vezes ao cinema, como O Monstro do Ártico (The Thing, 1951), O Enigma de Outro Mundo (The Thing, 1982), e A Coisa (The Thing, 2011). Mas ele chega, ao menos, a incluir entre àqueles que dedica o livro, o diretor Christian Nyby e o produtor Howard Hawks, da primeira versão para o cinema. Nas duas primeiras versões o monstro é um alienígena predador que ficou congelado por milhares de anos até ser despertado, inadvertidamente, por uma expedição no Ártico. Na terceira é encontrado numa nave espacial sob o gelo num planeta – um pouco semelhante ao clássico Alien, o Oitavo Passageiro (Alien, 1979), de Ridley Scott.
Mas ao invés, Simmons investe numa perspectiva sobrenatural para justificar a existência do monstro, chamado de Tuunbaq pelos nativos inuits da região, remetido à mitologia de criação do mundo deles. E isso fica exemplificado quando o capitão Crozier, depois de ferido em uma emboscada por um grupo de tripulantes amotinados, é salvo por Lady Silêncio, uma esquimó que havia sido adotada pela expedição após perder seu companheiro, e que recebeu este nome porque, misteriosamente, não tinha língua. Pois ela não é atacada pela fera, ao contrário, interage amistosamente. De acordo com a mitologia, os ataques aos homens brancos, forasteiros, seria uma forma do monstro proteger a cultura e a vida dos inuit.
Embora longo o livro não decai em interesse, e é mesmo notável como Simmons não enrola, pois em todos os capítulos, não só aspectos particulares são contados, mas também novas e dramáticas situações surgem. Há sempre um sentimento de apreensão sobre o que virá, e o livro está repleto de cenas visualmente poderosas, difíceis de esquecer. Os ataques furtivos e cruéis de Tuunbaq, as descrições do inverno escuro e rigoroso, as tempestades de raios, a aurora boreal, os sonhos premonitórios do capitão Crozier – ele mesmo com tendências à paranormalidade –, o encontro inesperado do tripulante John Irving com um grupo de esquimós, o destino cruel de vários personagens. Neste último caso, inclusive, chega-se a um ponto em que a leitura fica penosa, pois vários personagens morrem, um a um, seja de doenças, de frio, de fome, dos assassinatos ou pelas garras da fera sobrenatural.
Há também certa ambiguidade com o título do livro. Afinal, de que terror mesmo se refere? A do navio que curiosa e estranhamente chama terror? Do frio terrível que inviabiliza tragicamente a expedição? – como aconteceu na vida real –, ou do monstro assassino, não por acaso, apelidado pelos tripulantes de O Terror?
O romance foi finalista do British Fantasy Award em 2008 e recebeu uma adaptação na TV – que foi o que motivou a Editora Rocco a traduzir o livro, como informa, inclusive, na capa. Produzido por Steven Spielberg e Ridley Scott a série de mesmo nome foi ao ar em 2018 pelo canal fechado AMC, com oito episódios. Não vi o seriado, mas o livro já me bastou para considerar Dan Simmons como um dos mais talentosos contadores de história especulativa das últimas décadas. Autor da premiada série de FC espacial Hiperyon (1989), dele antes havia lido o forte e sofrido A Canção de Kali (Song of Kali, 1985), publicado em Portugal pela Editora Saída de Emergência, em 2009.
O que fica da leitura de mais de um mês de O Terror é que Simmons, para além da narrativa clara e fluente que prende o leitor, dos personagens vivos e complexos – semelhantes aos dos craques Stephen King e Peter Straub –, tem como maior virtude a capacidade de nos tornar próximos, cúmplices mesmo dos personagens, seus sonhos, medos, dramas, esperanças, e nos fazer sentir tudo isso com eles. Sobretudo por isso, O Terror não é apenas um livro grande, mas um grande livro.

– Marcello Simão Branco



[1] Publicado na antologia O que Será o Futuro? (The Future in Question), organizada por Isaac Asimov, Coleção Argonauta no. 327, Portugal, 1984.

domingo, 10 de março de 2019

A Noite do Demônio (Night of the Demon, Inglaterra, 1957)


Lançado em DVD no Brasil pela “Versátil”, na coleção “Obras Primas do Terror – Volume 1”, “A Noite do Demônio” (Night of the Demon / Curse of the Demon, 1957) é uma produção inglesa de horror psicológico, com fotografia em preto e branco e direção do francês Jacques Tourneur, famoso cineasta com preciosidades no currículo como “Sangue de Pantera” (1942), “A Morta-Viva” (1943),  “Farsa Trágica” (1963) e “Monstros da Cidade Submarina” (1965), esses dois últimos com Vincent Price.

Está escrito desde o início do tempo, até mesmo nessas antigas pedras (referência ao monumento histórico Stonehenge, na Inglaterra), que criaturas malignas sobrenaturais existem em um mundo de trevas. E também se diz que o Homem que pode utilizar o poder mágico dos antigos símbolos rúnicos, pode invocar esses poderes das trevas e os demônios do inferno. Ao longo das eras, o Homem tem temido e venerado tais criaturas. A prática da bruxaria e dos cultos do mal resistiu e ainda continua em nossos dias.” 

Um psicólogo americano, John Holden (Dana Andrews, de “Uma Fenda no Mundo”, 1965), viaja até Londres, Inglaterra, para participar de uma convenção científica com o objetivo de investigar e denunciar como fraude as ações de um culto demoníaco liderado pelo ocultista Dr. Julian Karswell (Niall MacGinnis).
Holden recebe a ajuda da jovem Joanna Harrington (Peggy Cummins), uma professora de escola infantil que é sobrinha do Prof. Harrington (Maurice Denham), um cientista que investigava a seita satânica e que morreu de forma misteriosa num acidente de carro. Ela tenta convencer o cético psicólogo americano dos perigos reais do satanismo e das práticas de bruxaria, e que ele pode ser uma vítima de uma maldição demoníaca que ameaça sua vida, através de um pergaminho com inscrições rúnicas.
“A Noite do Demônio” é um filme de horror psicológico e magia negra, cuja ideia central é o questionamento da existência do Mal, representado por criaturas do inferno invocadas em cultos satânicos. Combatendo o ceticismo e em alguns momentos o sarcasmo de John Holden, um homem da ciência que defende que os demônios são apenas invenções de auto-sugestão ou histeria em massa. Mas, os conceitos de feitiçaria não são apenas originários de princípios simplórios como a lendária bruxa cavalgando sobre sua vassoura, ou o mau olhado que tortura os pensamentos de sua vítima, ou o alfinete espetado na imagem que enfraquece a mente e o corpo. Os demônios podem ser reais e o cético John Holden irá arriscar sua vida para conhecer a verdade sobre essas criaturas ancestrais que já faziam parte de diversas culturas antigas, como o “Baal” dos babilônios, “Seth” dos egípcios, “Asmodeu” dos persas, ou “Moloch” dos hebreus.
Entre as curiosidades, vale destacar que o filme é baseado no conto “Casting the Runes”, de Montagne R. James, publicado em 1911. E uma questão bastante comentada é sobre a exposição do demônio, que aparece pouco e mesmo visto apenas em alguns momentos rápidos, muitos fãs e profissionais que trabalham com o gênero parecem concordar que seria mais eficaz para a história se ele nem aparecesse. Tanto que o diretor Jacques Tourneur, que prefere o horror sugestivo, fez questão de evidenciar que não era sua intenção mostrar a criatura, deixando para a imaginação do espectador, e que a decisão da exposição do monstro do inferno foi dos produtores, com as cenas adicionadas na pós-produção, sem a participação do diretor. Eu, particularmente, como apreciador do cinema bagaceiro de horror, gostei da aparição do demônio em efeitos toscos e divertidos (a criatura infernal estampa o pôster e recebeu grande destaque, ajudando muito na divulgação e trabalho de marketing).  

Como quem vai com medo e horror num caminho deserto. Pois sabe que algum demônio medonho o segue bem de perto.” – trecho do poema “A Balada do Velho Marinheiro”

(Juvenatrix – 07/03/19)

sexta-feira, 8 de março de 2019

Contos de terror

Contos de terror, Camilo Prado, org. 166 páginas Ilustrações internas e capa de Angelo Agostini. Edições Nephelibata, Desterro, 2016.

O gênero do horror sempre teve uma convivência mais íntima com o mainstream literário brasileiro, e não é difícil para o leitor atento identificar obras sombrias na bibliografia de uma infinidade de autores consagrados. Isso acontece devido a uma fase importante da arte literária, que acorreu entre o final do século 19 e o início do século 20, que os pesquisadores chamam de Decadentismo. Esse movimento artístico, herdeiro tardio do gótico, que em tudo reflete aos protocolos do horror como o conhecemos hoje, foi bastante popular na Europa – especialmente na França – e, por conseguinte, sua influência atingiu o Brasil em cheio, daí a razoável prodigalidade com que esse tipo de texto foi praticado, em comparação a outros gêneros da literatura especulativa.
Contos de terror, antologia organizada pelo pesquisador Camilo Prado para a editora independente Nephelibata, buscou reunir uma amostra da escola decadentista brasileira, para o que o organizador estabeleceu uma regra de ouro: só publicar contos em que os elementos tétricos fossem decorrentes de uma ação natural. Ou seja, nada de assombrações, demônios e outras manifestações do sobrenatural. Trata-se, portanto, de uma antologia de terror no sentido estrito, em que são apresentadas as faces mais sombrias do ser humano a partir da arte de autores renomados, quase todos em domínio público, numa tiragem muito pequena: apenas 70 exemplares numerados produzidos artesanalmente pelo editor. Este volume é uma espécie de lado B de uma publicação anterior, a antologia Contos decadentes brasileiros, já esgotado, mas que a editora pretende dar sequência com dois novos volumes que estão no prelo.
Outro aspecto interessante adotado pelos editores foi a manutenção da grafia da época, ou seja, os textos são apresentados da mesma maneira em que foram vistos originalmente, com as regras ortográficas da virada do século 19, o que dá um sabor especial à leitura, assim como as ilustrações do jornalista ítalo brasileiro Angelo Agostini, um dos primeiros ilustradores editoriais do país.
São quinze os textos presentes neste volume, de autoria de quatorze autores: Coelho Netto, Lucilo Varejão, Viriato Corrêa, Domicio da Gama, João do Rio, Julia Lopes, Humberto de Campos, Théo-Filho, Rodrigo Octavio, Monteiro Lobato, Carlos de Vasconcelos, Baptista Junior, Gastão Cruls e Medeiros e Albuquerque.  Alguns nomes são identificados com a literatura especulativa – como Humberto de Campos, João do Rio, Coelho Netto, Gastão Cruls e Monteiro Lobato –, mas a maior parte dos nomes é mesmo uma grata novidade. O organizador cuidou para que cada um deles fosse devidamente apresentado ao leitor numa breve biografia que antecede cada um dos contos, e ajuda bastante a contextualização do que será lido.
O conto que abre a seleta é "Na treva", de Coelho Netto, autor extremamente popular em sua época, dono de um estilo rebuscado com pendão para o inusitado, que conta a história vertiginosa de um grupo de passageiros a bordo de um trem noturno aparentemente desembestado.
Outro texto de destaque é "A peste", de João do Rio, que desenvolveu em seus contos um importante trabalho de registro da cultura carioca de sua época. Neste, o drama hospitalar sobre um surto de varíola.
"Madrugada negra", de Viriato Corrêa, não é de todo desconhecido. Trata-se de um relato em primeira pessoa, em que um homem conta a um grupo de amigos uma história de grande infortúnio. Contar uma história dentro de outra é um formato recorrente neste tipo de narrativa, e o autor de Cazuza, membro da Academia Brasileira de Letras, desfia aqui uma tragédia advinda da covardia de um homem.
Julia Lopes é a única mulher no grupo, e também única a comparecer com dois textos. "Sob as estrellas" envereda pela trágica relação de amor de um casal separado pela insensibilidade do homem, e "As rosas" é a história triste e tétrica de um jardineiro que perdeu a filha.
Outra história bastante antologizável é "O juramento", de Humberto de Campos, sobre um homem que testemunhou a amada ser devorada por índios canibais.
Gastão Cruls, autor do importante romance A Amazônia misteriosa, aparece aqui com "G.C.P.A.", também uma narrativa hospitalar sobre um homem que padece de uma doença rara.
"Bugio moqueado" é o texto de Monteiro Lobato, um dos maiores clássicos do terror brasileiro, originalmente publicado na coletânea Negrinha (1920), com o relato sobre a técnica educativa de um homem muito mau.
Também vale comentar aqui o texto de Rodrigo Octavio, "Gongo Velho (Cousas de outro tempo)", uma história pungente de exploração e preconceito que, ainda que tenha sido publicada em 1932, tem forte apelo em nossos dias.
A antologia é muito equilibrada e demonstra o quanto o Decadentismo foi prolífico no Brasil. Sabemos que muitos desses autores não se negavam a avançar nos domínios do sobrenatural quando lhes convinha, como se pode perceber na leitura de antologias como Páginas de sombra (Casa da Palavra, 2003) e Contos macabros (Escrita Fina, 2010). Mesmo sem o componente metafísico, Contos de terror junta-se a elas para contribuir com o estudo da presença da ficção de horror na literatura brasileira. Sem esquecer que também é, por si mesma, uma leitura perturbadora e, porque não, divertida.
Cesar Silva