terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Tempo fechado, Bruce Sterling


Tempo fechado (Heavy weather), Bruce Sterling. Tradução de Carlos Angelo. Capa de Vagner Vargas. Devir Livraria, São Paulo, 2008.

O escritor texano Bruce Sterling é um dos baluartes de um movimento estético e conceitual da fc que ficou conhecido como cyberpunk. Teve publicado anteriormente no Brasil apenas o romance Piratas de dados (Islands in the net, 1988) pela editora Aleph, além de alguns contos. O estilo de Sterling é arejado, agradável de ler, sem afetações e bastante interessante no que se refere aos temas propostos.
Tempo fechado conta a história dos irmão Alejandro (Alex) e Juanita (Jane), herdeiros de uma enorme fortuna mas que tiveram o azar de ter um pai controlador e nascer num mundo em processo de demolição por conta de incontornáveis prejuízos ambientais causados pela ação humana desregrada. As fronteiras internacionais praticamente não existem para eles, que vivem de uma forma selvagem, deslocando-se ilegalmente, escondendo-se do pai e um do outro. No início da história, Alex – que sofre de bronquite crônica aguda – está em tratamento de saúde numa clínica ilegal no México, gastando os tubos com medicamentos experimentais. Ele passa a maior parte do tempo drogado, mas Jane tem outros planos para o irmão. Com um equipamento de espionagem sofisticado, ela invade a clínica, resgata Alex e o carrega, num veículo todo-terreno que mais parece um robô, até uma região no meio-oeste americano onde há grande incidência de tornados – que têm sido cada vez mais violentos depois que as alterações climáticas interferiram no equilíbrio ambiental do mundo inteiro. Jane faz parte da Trupe Intempestiva, uma equipe de especialistas em tornados, cujo líder, Jerry, previu através de ensaios matemáticos a formação de um super-tornado que pode devastar toda a região e alterar definitivamente o clima global. Ninguém acredita que esse tornado possa acontecer, mas toda a Trupe espera que sim e se prepara caçando e estudando tornados menores. As previsões de Jerry indicam que o fenômeno deve acontecer dentro de alguma semanas e, por isso, todos estão ansiosos. Aos poucos, entendemos que Jane arriscou-se tirando o irmão da clínica mafiosa porque, no final das contas, estava completamente falida e esperava que o irmão pudesse suprir as necessidades financeiras da Trupe com a sua parte da herança familiar. Mas Alex vai além. Apesar da saúde comprometida, prova ser suficientemente rústico para se dar bem na Trupe. Ele realmente espera morrer no supertornado e assim dar algum sentido à sua vida. Mas a aventura pode ser um pouco mais complicada. Sempre é.
Conheci Sterling pessoalmente em 1997, durante a V InteriorCon, em Sumaré. Um cara muito simples e acessível, apreciador de churrasco e caipirinha, e penso que Alex é uma espécie de alter-ego dele. Como seus personagens, Sterling vive em deslocamento, cada hora num país diferente – quando esteve no Brasil, por exemplo, estava vindo de um temporada na Rússia. Apaixonado por culturas exóticas, aproveita para colocar essa rica experiência em sua literatura, o que acabou por caracterizar também o movimento cyberpunk como um todo. Ler Sterling acrescenta camadas de entendimento sobre o cyberpunk, que vai muito além de jargão tecno, brutalismo e óculos espelhados.
Sterling conta histórias que se passam no futuro tão próximo que mal chega a ser fantástico. Fala de coisas que já estão no dia-a-dia, que vemos ao nosso redor. Há seres humanos de verdade nas suas histórias, em situações que poderiam estar acontecendo de fato. 
Tempo fechado é uma história no seu tempo certo, colocando em debate a nossa responsabilidade coletiva, ou a falta dela, no cuidado com a natureza, o meio ambiente e o próprio homem. Afinal de contas, o tal supertornado pode até não acontecer, mas sabemos que a realidade sempre supera a ficção.
Cesar Silva

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