domingo, 16 de abril de 2017

O peculiar, Stefan Bachmann

O peculiar (The peculiar), Stefan Bachmann. 272 páginas. Tradução Viviane Diniz. Editora Record, selo Galera Júnior, Rio de Janeiro, 2014.

A Terra Velha, também conhecida como o mundo das fadas, liga-se ao mundo dos homens por portais que surgem eventual e naturalmente. Nesses episódios, homens desatentos os atravessam para ficar para sempre presos nas florestas selvagens da magia, ou fadas vêm parar aqui, onde definham por causa da magia fraca. Mas, em raríssimas vezes, surgem portais grandes o suficiente para que muitas fadas atravessem para o nosso mundo. É quando as coisas realmente ruins acontecem. Foi o que ocorreu em Bath, uma pequena aldeia próxima de Londres, na noite de 23 de setembro de algum ano no século 19. Todos os aldeões desapareceram misteriosamente e uma horda fadas selvagens começaram a causar todo tipo de problemas nos arredores. O exército interveio e uma guerra feroz aconteceu. No início, foi um massacre, mas aos poucos os homens aprenderam a subjugar as fadas e acabaram por vencê-las. Com o fim do conflito, que ficou conhecido como Guerra Sorridente, o mundo mudou. As fadas se tornaram um recurso valioso entre os homens, como fonte alternativa à tecnologia, embora esta ainda predomine na maior parte do mundo. Máquinas movidas a carvão e magia são coisas corriqueiras. Na virada do século, homens e fadas desfrutam de uma convivência quase pacífica, embora estas ainda estejam, em sua maior parte, escravizadas ou segregadas em guetos insalubres. As fadas até são toleradas, ao ponto de terem representantes no Parlamento, mas uma categoria delas é odiada pela sociedade, tanto humana quanto mágica: os peculiares, popularmente chamados de medonhos. Filhos da união entre fadas e homens, sem ser nem homens nem fadas, os peculiares são odiados e perseguidos até a morte. Por isso, ninguém ligou quando corpos ocos de peculiares jovens começaram a surgir boiando no Tâmisa.
Na periferia favelada de Bath, no Beco do Velho Corvo, os irmãos peculiares Bartholomew e Hattie Kettle moram com sua mãe humana. Seu lema de vida é "não seja notado e não será enforcado". Por isso, vivem escondidos no barraco que chamam de casa, fora das vistas de todos. Mas como a curiosidade também é um traço forte nas crianças peculiares, Barth vê quando uma linda e elegante dama num vestido cor de ameixa leva embora um de seus poucos amigos, peculiar como ele, entregue pela própria mãe a troco de alguma coisa. Mas a bisbilhotice de Barth não passou despercebida.
Em Londres, o despreocupado Sr. Jelliby segue com sua vida confortável como representante no Parlamento. Sobreviver às tediosas reuniões políticas é o principal desafio de sua vida, sendo que passa o restante de seu tempo em festas, espetáculos e bons restaurantes da metrópole. Mas o destino tem outros planos para ele e as coisas começam a acontecer muito rápido quando é obrigado, muito a contragosto, a comparecer a uma reunião social protocolar na residência do Lorde Chanceler John Wednesday Lickerish, a mais bem posicionada fada do império. Quando mais um peculiar é encontrado no Tamisa, um turbilhão de acontecimentos sinistros colocará o Sr. Jelliby ao lado do jovem Bartholomew, empurrando-os literalmente em direção ao fim do mundo.
O peculiar (The peculiar) é o romance de estreia do jovem escritor americano Stefan Bachmann, publicado em 2012 pela Harper Collins quando tinha apenas 19 anos, sendo elogiado por autores como Rick Riordan e Christopher Paolini. Bachmann nasceu em 1993, no Colorado, e vive atualmente em Zurique, na Suiça, onde estuda música, tendo composto uma trilha sonora para o livro, disponível em ThePeculiarBook. A edição brasileira veio em 2014 pelo selo Galera Junior da editora Record, com tradução de Viviane Diniz.
O romance impressiona pela concisão e boas ideias, dialogando com obras vultosas como o premiado Jonathan Strange & Mr. Norrell, de Susanna Clarke. Há um toque steampunk secundário na trama, embora seja um elemento útil em vários momentos. Também há méritos do autor na habilidade em reconstruir o ambiente britânico, algo que nem todo americano consegue tão naturalmente.
Bachmann escreveu uma sequência, The whatnot, publicado originalmente em 2013 e traduzido no Brasil pela mesma Record em 2015 com o título de Não-sei-o-quê, cujo capítulo inicial está disponível para leitura aqui.
-- Cesar Silva

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