Renato
Rosatti fala sobre o recorde de seu fanzine Juvenatrix e as
perspectivas do fandom e do horror no Brasil
por Marcello Simão Branco
Renato Rosatti foi o meu primeiro companheiro de projetos
na ficção científica e no horror. Juntos criamos o Megalon, no
segundo semestre de 1988, que se tornou o mais premiado fanzine da história dos
gêneros no país. Conforme o Renato detalha a seguir, ele seguiu rumo próprio
como fanzineiro e no mês de abril de 2019 atingiu uma marca incrível: seu
fanzine Juvenatrix chegou à 200ª edição. Dificilmente uma
outra publicação do gênero no país atingirá esta marca. Em outros tempos tal
acontecimento teria gerado alguma repercussão entre os fãs interessados. Mas
neste século XXI, isso não ocorreu, pois houve uma desarticulação entre os
antigos fãs dos anos 1980 e 1990, como também surgiu uma nova geração, mais
pulverizada em grupos segmentados e mais atuantes no meio virtual. Desta forma
não é exagero dizer que o Juvenatrix é uma das instituições
sobreviventes da Segunda Onda da Ficção Científica Brasileira. Renato conta um
pouco sobre a história do zine, seu idealismo por fanzinar, sua
paixão por filmes de horror e FC e o que pensa sobre o atual momento do horror
no Brasil.
Nos conte um pouco sobre a longa
trajetória do Juvenatrix, até atingir esta marca histórica de
duzentas edições.
Vou falar um pouco sobre minha trajetória como fanzineiro.
Iniciei as atividades em novembro de 1988, na co-edição do fanzine Megalon,
ao lado de Marcello Simão Branco, até 1991. A partir de janeiro desse mesmo
ano, passei a editar o Vortex que depois passou a se
chamar Juvenatrix a partir do número 7. Depois
vieram em janeiro de 1995 o Astaroth e em janeiro de 2001
o Carnage. Algumas curiosidades: o nome Vortex foi
inspirado na sociedade futurista do filme de FC Zardoz (1973);
o nome Juvenatrix foi inspirado no título original de um filme
americano obscuro de horror, Re-juvenator (Rejuvenatrix,
1988). O Astaroth tem o nome inspirado num demônio do
filme Uma Filha Para o Diabo (1976). São todas publicações
voltadas para a arte fantástica, com contos, resenhas de cinema e literatura,
ilustrações, quadrinhos e divulgação de produção alternativa. O Juvenatrix era
impresso até o número 107 e a partir da edição 108 (novembro de 2007), migrou
para o formato eletrônico em arquivo PDF distribuído por e-mail. Ao chegar à
edição 200, ficou registrada uma história com números expressivos: 29 anos,
4711 páginas e milhares de textos publicados.
O que a edição do Juvenatrix,
e mais geralmente a prática da edição de fanzines, representa para
você? Ou seja, o que mais te motiva a ser um fanzineiro?
Editar um fanzine é um ato de
idealismo e satisfação pessoal. Sou apreciador de horror e ficção científica e
sempre quis fazer algo extra além de ser apenas um consumidor. Encontrei nos
fanzines uma forma de produzir esses gêneros da arte fantástica.
Eu imaginei que nesta edição
histórica você repetiria algumas das edições especiais que marcaram o Juvenatrix,
como a inesquecível edição 50, publicada em abril de 2001, que contou,
justamente, com 200 páginas. Por que isso não se repetiu?
Essa super edição do Juvenatrix 50
teve a presença de 51 colaboradores e bateu um recorde de páginas em um único
volume (202), com capas coloridas, encadernação em espiral e edições numeradas
e assinadas pelo editor. Não foi possível repetir a dose com algo similar.
Os tempos são outros e bem mais tenebrosos. Não tenho disponibilidade para
gastar tanta energia em produzir algo tão grandioso. A repercussão das pessoas
também não é mais a mesma, e os fanzines perderam o interesse, ficando cada vez
mais no passado. Manter a chama acesa, mesmo que fraca, ainda é uma missão
do Juvenatrix.
De que forma a transição da
versão impressa para a digital (em PDF) significou também uma mudança de
patamar do fanzine e do tipo de colaboração que ele passou a receber?
Mudar para um formato eletrônico em
arquivo PDF tornou-se a única saída para continuar existindo. É inviável editar
o Juvenatrix de forma impressa em tamanho A4, com os altos
custos das cópias e distribuição pelos correios. As pessoas preferem gastar
dinheiro com um sanduíche e refrigerante que são consumidos em cinco minutos,
do que com um fanzine. Com essa mudança, também ficou mais fácil a edição e
distribuição por e-mail, atingindo uma quantidade maior de leitores. Quanto às
colaborações, não mudou muita coisa. Tenho alguns poucos colaboradores
regulares, e quando necessário utilizo materiais de minha autoria, sejam
inéditos ou republicados da versão impressa, que tinha tiragem pequena.
Neste século 21 o que restou do
fandom de FC&F dos anos 1980 e 1990 se dissipou quase completamente em
outros grupos de fãs mais recentes. Assim, podemos afirmar que o Juvenatrix é
uma instituição sobrevivente do tempo em que os zines eram mais
importantes?
Os fanzines eram mais importantes
antigamente. Hoje, até sites e blogs da internet enfrentam dificuldades para
sobreviverem. As pessoas têm preguiça de ler e estão preferindo vídeos no
Youtube. O Juvenatrix é mesmo um sobrevivente. São 29 longos
anos de edição ininterrupta. Pode até estar respirando por aparelhos, mas ainda
está vivo. E deverá continuar, mesmo se tiver que utilizar materiais não
inéditos, pois tenho centenas de resenhas de cinema que escrevi ao longo dos
anos e que foram publicadas apenas nas versões impressas de meus fanzines.
Além do Juvenatrix você
já editou outros zines de horror, como o Astaroth e o Boca
do Inferno - este uma derivação do site de mesmo nome. Nos fale
sobre seus próximos projetos e se pretende voltar a editar outro zine além
do Juvenatrix.
Também teve o Carnage,
com duas edições lançadas em 2001 e 2002. O Astaroth voltou a
circular impresso com alguns números, mas novamente retornou para sua tumba
fria. Sinceramente, se eu conseguir manter o Juvenatrix vivo,
já estou satisfeito. Então, esse é o meu único projeto, além de escrever
resenhas de cinema de horror esporadicamente.
Nestes últimos tempos alguns
observadores tem apontado que o horror voltou a estar na moda aqui no
Brasil, com o lançamento de filmes e livros de autores nacionais. Você
concorda com isso? Poderia apontar algumas tendências interessantes do
horror em geral neste século 21?
Atualmente temos uma cena ativa com
produção de horror nacional, sejam filmes ou livros, e a internet e redes sociais
estão contribuindo com a facilidade de divulgação dos diversos projetos, além
dos financiamentos coletivos. Muitos apreciadores do estilo estão se
aventurando na produção de vídeos independentes e escrevendo histórias.
Torçamos para que perdure e todos nós seremos beneficiados com esse movimento.
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