Marina
e os tesouros da tribo de Dana: Os deuses do mar,
Simone O. Marques. 244 páginas. Capa de Marina Avila. Ilustrações
de Patrícia Kovacs. Modo Editora. Rua Guatemala, Campo
Grande, MS, 2012.
A
estreante Modo Editora, empresa baseada na cidade de Campo Grande,
Mato Grosso do Sul, inaugurou seu catálogo privilegiando a
literatura fantástica, com um toque romântico e feminino. Entre os
autores da casa, quem mais recebeu atenção foi a paulistana Simone
O. Marques, escritora de sólida formação acadêmica, com gradução
em psicologia e mestrado em educação, que já havia publicado
diversos romances em edição própria. Em 2012, a Modo relançou
dois de seus títulos principais, Paganus e Agridoce, e
o inédito Marina e os tesouros da Tribo de Dana: Os deuses do
mar. Trata-se de um episódio de uma longa saga iniciada com o já
citado Paganus – primeiro publicado como Gênese pagã
(2008) – seguido dos romances Triskle (2009), Tribo de
Dana (2009) e Era de aquário (2010), este publicado em
dois volumes. A série acompanha a história de uma dinastia de
sacerdotisas celtas e suas dificuldades em praticar sua fé num mundo
cristão.
Pelas
resenhas disponíveis na internet, trata-se de um trabalho para
leitoras adultas, mas esse não parece ter sido o público-alvo do
episódio aqui resenhado. Os deuses do mar é claramente um texto para leitoras
adolescentes: a linguagem é simples e de características juvenis,
com muita ação e romance.
Marina
é uma jovenzinha de dezesseis anos, encarnação de uma trindade de antigas
deusas celtas. Devido a sua natureza divina, é diligentemente
protegida pela Tribo de Dana, comunidade isolada na Chapada dos
Veadeiros, em Goiás. Ela é ali conhecida como a Pequena Dana,
vigiada dia e noite por guardas-costas exclusivos, que ela chama de
Sombras.
Ressentida
com a falta de liberdade, Marina está sempre se metendo em
enrascadas nas mais diversas armadilhas que a floresta esconde. E é
justamente numa dessas oportunidades que ela e dois jovens Sombras,
Brian e Arthur, vão parar numa terra estranha depois de cair num
buraco dentro de uma espécie de túmulo ancestral. Nesse País das
Maravilhas celta, localizado nos subterrâneos no planalto central do
País, há duendes e harpias, frutas e animais encantados, deuses e
deusas de intenções ambíguas. Para voltar a salvo para a tribo, o
trio terá de reunir um determinado conjunto de objetos mágicos cuja
função não é explicada. Enquanto correm daqui para lá tentando
escapar dos perigos dessa terra desconhecida, Marina rende-se aos
encantos de Brian, que corresponde o interesse. As cenas de romance
são recatadas mas verdadeiramente emocionantes, com Arthur, o
segundo guarda-costas, funcionando como o elemento que impede
desdobramentos mais picantes na relação. A história, contudo, não
é conclusiva e encerra sem que os jovens consigam reunir todos os
objetos e voltar ao seu mundo, o que talvez só aconteça na
sequência Fadas e druidas,
anunciada na última página do livro.
A
produção gráfica do volume é elegante, sendo a capa assinada por
Marina Avila, que também organizou a apresentação visual interna,
com entrelinhamento largo e muitas vinhetas retiradas de detalhes da
imagem vista na capa. Quatro ilustrações de Patrícia Kovacs
espalham-se pelo livro: realizadas na estética dos quadrinhos
japoneses, dialogam bem com o leitor jovem, mas não se integram
adequadamente à proposta gráfica da edição, que sugere algo mais
místico.
Excetuando-se
as licenças próprias às histórias de fantasia, como fato de
existir uma tribo celta vivendo incógnita em meio ao cerrado de um
parque nacional, tudo estaria muito bem, mas há um insistente
subtexto proselitista que não é possível ignorar. Ele fica claro
na leitura do prólogo, que faz um resumo dos episódios anteriores
da série, e mantém-se ao longo da narrativa em insistentes citações
da autora.
O
prólogo informa que, alguns anos antes e com um simples desejo,
Marina eliminou todas as armas de fogo e bombas nucleares do mundo,
assim como os recursos para recriá-las. Por isso, tornou-se alvo do
ódio, não das agências de segurança internacionais como seria de
se supor, mas da igreja cristã, que montou um exército para
caçá-la. No confronto final, às portas da aldeia, a Tribo de Dana
foi socorrida pelas divindades celtas e derrotou não apenas o
exército cristão, mas também o próprio Deus, dando início a uma
nova ordem mundial em resgate à vida simples e à preservação da
natureza. Há alguma ingenuidade aqui, pois não se sabe o que foi
feito de todas as demais religiões que existem no mundo. E todas
essas boas intenções não aplacaram a paranoia da Tribo de Dana
que, como se percebe na leitura do romance, segue armando e treinando
exaustivamente seus guerreiros.
Dependendo
da forma com que o leitor receber esse subtexto, podem ser anulados
todos os méritos da obra como literatura fantástica. Mesmo assim,
Os deuses do mar pode
ainda ser uma experiência divertida.
—
Cesar Silva
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