“Vocês verão
os templários retornarem dos mortos! Destruiremos tudo e todos! Somos imortais!
E vocês?”
É interessante notar como o mercado brasileiro
de vídeo VHS já lançou uma quantidade infindável de filmes que não estão mais
disponíveis. Quando a febre dos aparelhos de vídeo cassete iniciou no país, por
volta de meados dos anos 1980, surgiu uma grande quantidade de distribuidoras
de filmes em VHS que eram tão pequenas e desconhecidas quanto os filmes que lançavam
no mercado. Tanto é que a maioria faliu e desapareceu há muitos anos, deixando
suas fitas perdidas principalmente em pequenas locadoras de bairro ou sebos
espalhados pelo Brasil. Porém, muitos desses filmes desconhecidos, de todos os
gêneros, são verdadeiras preciosidades e tornaram-se raridades fora de catálogo
para colecionadores e apreciadores do cinema menos convencional. Principalmente
agora, com a proliferação dos filmes em discos DVD , que estão tornando-se cada vez mais
populares e diminuindo a atenção dispensada pelo público às fitas VHS, num
movimento similar ao que já aconteceu com a música, entre os nostálgicos discos
de vinil e os modernos CD´s.
Um filme de
horror em especial, com o sonoro título de “O Retorno dos Mortos-Vivos” (The
Return of the Evil Dead), lançado no Brasil pela extinta “Visocopy”, é uma rara
produção espanhola de 1973 que exemplifica muito bem o que foi exposto acima. É
um filme pouco conhecido no Brasil, de baixo orçamento no mais tradicional
“horror bagaceiro”, e típico representante do cinema “trash”, ou seja, com
roteiro óbvio, diálogos banais, situações previsíveis, atores canastrões e
amadores, efeitos toscos e tantas outras deficiências não propositais que o
tornam exatamente por isso um filme que desperta interesse e principalmente
proporciona um inusitado momento de entretenimento. Sem contar outros motivos
que ajudam a torná-lo ainda mais especial, como sua raridade e dificuldade de
acesso, sendo um filme espanhol com mais de quarenta anos desde sua obscura produção.
Além de ser um exemplar tipicamente influenciado pelo clássico filmado em preto
e branco “A Noite dos Mortos-Vivos” (The Night of the Living Dead), dirigido
por George A. Romero em 1968, que trazia basicamente um grupo de pessoas
encurraladas numa casa de campo enfrentando a fúria assassina de uma multidão
de zumbis famintos por carne humana. Em “O Retorno dos Mortos-Vivos”, a
história mostra um grupo de sobreviventes de uma pequena cidade refugiados numa
igreja, sendo ferozmente atacados por mortos-vivos portando espadas em busca de
vingança contra o que lhes aconteceu no passado.
O filme inicia
mostrando uma seita da Idade Média realizando rituais satânicos num castelo de
estilo gótico. Eles são templários que trouxeram do Oriente o segredo da vida
eterna, realizando sacrifícios humanos para as supremas forças do mal,
arrancando o coração das vítimas, comendo suas vísceras e bebendo o sangue.
Revoltados com os assassinatos nas cerimônias demoníacas, os aldeões locais
capturam os templários e os executam queimando-os vivos em fogueiras. Uma vez
os satanistas prometendo retornarem do mundo dos mortos para se vingarem, os
aldeões então queimaram primeiro os seus olhos antes de atearem fogo em seus
corpos, para com isso impedirem sua volta. Um dos próprios moradores da cidade
explica o folclore em torno dos templários: “De acordo com a lenda, os aldeões
queimaram seus olhos para que não pudessem voltar, para se vingarem. A
superstição diz que eles seguem o som!”.
Muitos anos
depois, a pequena vila portuguesa de Bouzano está se preparando para comemorar uma
festa para lembrar a vitória de seus antepassados sobre os templários, onde
eles simulam a execução dos satanistas com bonecos presos em fogueiras. Para
alegrar ainda mais a festa, o prefeito Duncan (Fernando Sancho) e seu
assistente Howard (Frank Blake), contratam um técnico americano em fogos de
artifício, Jack Marlowe (Tony Kendall). Ao chegar à cidade, Jack reencontra uma
antiga namorada, a agora noiva do prefeito, Srta. Vivian (Esther Roy), com quem
acaba se reaproximando e com isso despertando a ira de Howard, que estava
apaixonado pela jovem.
Enquanto os
habitantes do vilarejo se divertem com a animada festa noturna, dançando e
assistindo a queima dos fogos de artifício, próximo dali, no antigo castelo em
ruínas dos templários, eles ressurgem do mundo dos mortos saindo de suas tumbas
para consumarem sua vingança prevista quando foram barbaramente executados nas
fogueiras. Eles se reúnem em grande quantidade, cavalgando cavalos mortos e
portando espadas afiadas, e se dirigem à cidade para iniciarem um massacre.
Após sangrenta carnificina, numa gritaria sem fim, com mortos e feridos para
todos os lados, um grupo de sobreviventes se refugia numa igreja, sendo
encurralado pelos templários esqueléticos. Formado pelo herói mocinho Jack, sua
namorada Vivian, o prefeito corrupto e sem escrúpulos Duncan e seu capanga
Howard. Ainda tem um casal, Bert (Ramón Lillo) e Amalia (Lone Fleming), com sua
pequena filha Nancy (Maria Nuria), uma bela jovem, Monica (Loreta Tovar), que
havia visto o namorado ser assassinado, e o vigia do local, um retardado corcunda,
Murdo (José Canalejas), que ajudou no
retorno dos mortos-vivos matando uma mulher diante de suas tumbas, mas que foi
ignorado pelas caveiras ambulantes. Uma vez encurralados na igreja por uma
multidão de mortos-vivos, o grupo vai aos poucos sendo dizimado violentamente
enquanto lutam pela sobrevivência, aguardando a chegada do amanhecer.
Algumas cenas
são bastante interessantes, destacando as sequências em que os templários têm
seus olhos dolorosamente queimados por tochas ardentes em fogo; ou quando um
homem tem sua mão e outro sua cabeça violentamente decepados em golpes precisos
das espadas dos mortos-vivos; ou ainda na brutal chacina dos habitantes do
pequeno vilarejo, numa correria desenfreada com sangue e corpos caindo aos
montes, vítimas dos templários vingadores.
Os efeitos
especiais são extremamente precários, principalmente num momento em que o herói
Jack arremessa sobras de fogos de artifício nos zumbis com o objetivo de
derrotá-los. Alguns caem mostrando claramente tratarem-se de simples bonecos
imóveis, num efeito exageradamente tosco. O roteiro tem erros grotescos de
continuidade e diálogos tão infantis que nos incitam a torcer para o sucesso do
plano de vingança dos bruxos medievais. Porém, os figurinos dos mortos-vivos
são bastante convincentes, dando a impressão sombria de esqueletos podres
vestindo grandes capas surradas e desgastadas pelo tempo, auxiliados por uma
fotografia escura.
“O Retorno dos
Mortos-Vivos” é o segundo filme de uma série de quatro dentro do mesmo universo
ficcional, porém com histórias independentes. Sendo precedido por “A Noite do
Terror Cego” (1972) e tendo outras duas sequências posteriores, “O Galeão
Fantasma” (1974) e “A Noite das Gaivotas” (1975), todos dirigidos por Amando De
Ossorio e constituindo-se numa cultuada tetralogia do cinema fantástico
envolvendo a sempre fascinante temática de “mortos-vivos”.
(Texto originalmente em Fevereiro de 2003, publicado em 10/12/2005 no
blog www.juvenatrix.blogspot.com.br)
O Retorno dos
Mortos-Vivos (El Ataque de los Muertos Sin Ojos / The Return of the Evil
Dead / The Return of the Blind Dead, Espanha, 1973). Ancla Century / Atlas
International. Duração: 83 minutos. Direção e roteiro de Amando De Ossorio.
Produção de Raymond Planta. Fotografia de Michael Mila. Edição de Joseph
Anthony. Maquiagem de Joe Louis Campos. Música de Tony Abril. Elenco: Tony
Kendall, Fernando Sancho, Esther Roy, Frank Blake, Lone Flemming.
(Juvenatrix - Fev. 2003)
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