Missão em Sidar (Rayons pour Sidar), Stefan Wul. Tradução do Eng. Gomes dos Santos. Capa de Lima de Freitas. 151 páginas. Lisboa: Edições Livros do Brasil, Coleção Argonauta, no. 72, 1963. Lançado originalmente em 1957.
Estamos em 2023 e a conquista do espaço avançou bem mais do que em nossa realidade. A Terra mantém um governo de colonização no planeta Sidar, que orbita Alfa do Centauro, a estrela mais próxima do Sol, situada a 4,3 anos-luz. Mas, depois de assinar um tratado de cessão de Sidar aos alienígenas de Xress – outro planeta do sistema de Alfa do Centauro –, os terráqueos preparam-se para evacuar o planeta.
Estamos em 2023 e a conquista do espaço avançou bem mais do que em nossa realidade. A Terra mantém um governo de colonização no planeta Sidar, que orbita Alfa do Centauro, a estrela mais próxima do Sol, situada a 4,3 anos-luz. Mas, depois de assinar um tratado de cessão de Sidar aos alienígenas de Xress – outro planeta do sistema de Alfa do Centauro –, os terráqueos preparam-se para evacuar o planeta.
Neste
contexto chega a Sidar o físico afrancês Lorrain – assim mesmo
com o “a”, mas sem maiores explicações –, que pretende
resgatar o seu robô Lionel, que perdeu contato com seu dono. Muitos
terrestres têm como companhia um androide, igual ao seu
proprietário, mas que tem sua vida garantida apenas na medida em que
o dono esteja vivo. Pelo nível de intimidade ambígua mostrada nesta
relação, parece ser comum a substituição de um companheiro
humano, e no caso de um homem, uma mulher, sugerindo daí, talvez, um
tipo de relação homoafetiva.
Em
meio à transição que vive Sidar a tarefa de Lorrain é muito
complicada, pois o planeta é quase que inteiramente tomado por uma
vegetação intensa e fechada, habitada por animais perigosos. Depois
de contactar Marco, um administrador de uma vila local, que está
deprimido pela perda de seu robô Marcial, Lorrain segue para a
província de Horb, onde seu robô Lionel havia se instalado. Na
verdade a tarefa vai muito além do mero reencontro sentimental, pois
ambos estão em Sidar numa missão secreta.
Após
ser ferido pelos nativos de Horb – que vivem como tribos indígenas
–, Lorrain surpreendentemente morre. Lionel o recolhe e guarda numa
câmara frigorífica com o objetivo de ressuscitá-lo, pois o sucesso
da missão depende da atuação da dupla. Mas como assim,
ressuscitá-lo? Sim, existe uma tecnologia capaz de reviver quem
morre, mas Wul não dá maiores detalhes de como isso seria possível.
Lionel tem de voltar com urgência para Gayam – a maior cidade de
Sidar –, para cumprir sua missão. No caminho ele encontra Marcial,
reduzido apenas à cabeça, depois de sofrer um acidente com a queda
de uma rocha. Aliás, a razão do sumiço de Lionel ocorrera por
motivo semelhante, desfigurado com o ataque de um krotang, um dos
mais terríveis predadores. Levando Lorrain num saco mortuário e a
cabeça de Marcial – que retém sua consciência e memória –
Lionel termina por reencontrar com Marco e, com sua ajuda, colocar em
prática seus objetivos.
Com
um ritmo veloz de acontecimentos Missão
em Sidar
é o quinto romance de Stefan Wul publicado na clássica coleção
francesa Fleuve Noir e, curiosamente, traduzido apenas para Portugal
e Finlândia.1
O romance está dividido em três partes: a chegada de Lorrain e seu
encontro com Lionel; a peregrinação do androide para ressuscitar
seu dono e salvar a missão, e a terceira parte, onde ocorre o
desenlace final.
Na
verdade a Terra não queria ceder Sidar aos belicosos xressianos,
pois estes pretendiam ocupar o planeta com o extermínio da população
local. Mas interesses políticos e econômicos prevaleceram na
votação dos membros da Assembleia Solar. Com isso, secretamente, é
elaborado um plano para infiltrar Lionel em Sidar para que este
preparasse o terreno até a chegada de Lorrain e, assim, colocar em
prática o combinado para impedir a ocupação dos xressianos.
Como
dá pra notar Wul trata da questão do imperialismo, assim como já
visto no romance anterior O
Mundo dos Draags –
resenhado aqui.
Mas se neste havia uma metáfora da escravidão, aqui estamos diante
de uma disputa política de dois impérios (Terra e Xress) pela posse
de Sidar – e chega a lembrar um pouco a disputa entre britânicos e
franceses por territórios dos árabes desunidos após a Primeira
Guerra Mundial. Pois em Sidar também não havia um povo
politicamente coeso em torno de um mesmo objetivo. Mas embora não
torne evidente uma discussão maior sobre o tema e nem critique a
colonização em si, mas a opção entre uma boa e outra
ruim – que levaria ao genocídio –, o romance se insere no
contexto da década de 1950, no
qual a
França vivia um problema sério com as lutas emancipatórias de sua
principal colônia africana, a Argélia, que se aproximava de sua
independência, mas com firme oposição de parte do establishment
francês.
Neste sentido alguns romances de FC pulp de Wul mostram-se eivados por um subtexto político, acrescentando um conteúdo crítico para além da mera aventura de entretenimento, com o qual ele é mais identificado. E que, em Missão em Sidar nos leva ao clímax quando os planos de Lorrain e Lionel entram em ação, com a retirada de Sidar da órbita de Alfa do Centauro até tornar-se um novo planeta do sistema solar - situação já mostrada em Pré-História do Futuro (Niourk, 1957), onde é a Terra que escapa de sua órbita - ver a resenha aqui
Wul
explica como isso seria possível – em mais uma proeza criativa
depois da cena da ressuscitação de Lorrain –, com passagens que
justificam sua fama como um autor inventivo e capaz de conduzir o
leitor a sensações
verdadeiramente delirantes.
– Marcello
Simão Branco
Resenha muito boa, Marcello, que sugere um romance pulp mas de várias camadas. Se bem me lembro, André Carneiro era outro admirador de Stefan Wul.
ResponderExcluirValeu Causo, prezo muito seu comentário. E, puxa, não sabia desta predileção do André. Abraço.
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