Com produção de Francis Ford
Coppola e direção de Tim Burton, já fica previsível o resultado dessa união: um
excelente filme de horror gótico, “A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça”, com todos
os elementos característicos do gênero, casarões sombrios, florestas com
árvores fantasmagóricas e constante névoa espessa, cemitério horripilante com
suas lápides de pedra, carruagens e vestuário do século XIX, etc. Burton também
homenageou o lendário ator Christopher Lee, que participou em magistrais,
nostálgicos e emocionantes 3 minutos de película na pele de um burgomestre,
assim como ele fez em 1990 com o já falecido Vincent Price em “Edward Mãos de
Tesoura”.
Lee é o único, ainda vivo com
mais de 90 anos de idade, do grupo de atores que moldaram o Horror
cinematográfico ao longo dos anos 1950, 60 e 70, ao lado de Price (1911-93),
Peter Cushing (1913-94), John Carradine (1906-88) e Donald Pleasence (1919-95),
entre outros, e que tem sua carreira principalmente marcada por suas
interpretações como o “Conde Drácula” (das produtoras inglesas “Hammer” e “Amicus”),
e diversos outros vilões do Horror. O diretor também homenageou novamente o
grande e veterano Martin Landau, que participou em poucos minutos no início do
filme como o patriarca da família Van Garrett, sendo logo decapitado. Ele
também é um ícone do gênero muito conhecido por atuar fixo na antiga série de
ficção científica da TV “Espaço
Tem também o eterno vilão do
cinema moderno Christopher Walken (o diabólico anjo Gabriel de “Os Anjos
Rebeldes”, 1994), cujo nome só aparece nos créditos finais (o que também é
estranho). Ele, que encarnou magistralmente o cavaleiro decapitador de cabeças
(quando ele ainda tinha a sua, é claro), sem precisar emitir uma única palavra
e apenas utilizando-se de interpretações faciais e grunhidos de gelar a alma
dos vivos e mortos, ajudado pela expressão de seus dentes pontiagudos
serrilhados especialmente para impor de forma mais acentuada sua ferocidade
anormal.
E para completar o time, o jovem
casal de protagonistas é formado por Johnny Depp e Christina Ricci. Ele iniciou
sua carreira no primeiro filme da franquia “A Hora do Pesadelo” (1984), além do
drama de guerra “Platoon” (1986), a série televisiva “Anjos da Lei” (1987-90) e
participações em outros filmes de Burton como “Edward Mãos de Tesoura” e “Ed
Wood’. Já a lindíssima Christina Ricci, cuja beleza fenomenal é a única
oposição ao horror sanguinário do filme, foi a garota esquisita de “A Família
Addams”, com os cabelos morenos, e agora produzida com longos cabelos loiros,
que realçaram ainda mais sua beleza.
Depois de uma introdução desse
porte fica fácil imaginar a grandiosidade dessa obra, que já concorre como um
dos melhores filmes de horror dos carentes últimos tempos. “A Lenda do
Cavaleiro Sem Cabeça” (Sleepy Hollow, 1999) estreou nos cinemas brasileiros em
28/01/2000, dirigido por Tim Burton, que já é conhecido por suas outras
produções similares dentro do universo gótico como a belíssima fantasia “Edward
Mãos de Tesoura”, “Batman” 1 e
O cinema de Horror ao longo de
sua história gerou muitas faces, entre elas os velhos filmes góticos
ambientados em séculos recentes do passado, com mansões obscuras, famílias
amaldiçoadas, ou as obras que exploraram o horror psicológico em histórias de
fantasmas e assombrações, ou ainda aqueles centrados em violência explícita com
muito sangue entre zumbis, monstros disformes e psicopatas modernos. Mas o
horror que mais assusta e influencia o público é certamente aquele mais próximo
da realidade do que da ficção. A história da humanidade está repleta de
referências e provas decisivas de grandes atrocidades cometidas como guerras
bestiais e sangrentas e torturas insanas, e vários foram os filmes que
utilizaram essa temática. “A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça” mistura a realidade
dos ferozes guerreiros do passado que empalavam e decapitavam suas vítimas por
puro prazer sádico, à ficção sobrenatural de fantasmas que retornam do inferno
para continuar a espalhar sangue através de suas espadas. A união desses
elementos resultou num filme agressivo por sua violência, apesar de bons
momentos de humor negro, e divertido por suas caracterizações góticas, sem
contar as diversas homenagens que Tim Burton fez tanto com os atores especialmente
convidados quanto às referências de velhos filmes.
O diretor já havia feito isso de
maneira muito mais detalhada na paródia de FC “Marte Ataca!” (1996), onde ele
homenageia todos os velhos clichês da ficção científica dos anos 50 e
Em “A Lenda do Cavaleiro Sem
Cabeça”, baseado no livro “The Legend of Sleepy Hollow”, de Washington Irving,
a história passa-se em 1799 e fala de um sanguinário guerreiro (Christopher
Walken) cuja especialidade era decepar as cabeças de seus inimigos em batalhas
decididas pelo aço das lâminas das espadas. Ele era como se fosse o próprio
demônio na Terra, lembrando personagens reais de nossa sangrenta história como
o Drácula que empalava seus prisioneiros de guerra. Um fato curioso é que nas
cenas onde o vilão já está sem sua cabeça e nas sequências onde ele cavalga seu
corcel negro, a interpretação ficou por conta de Ray Park, o Darth Maul do
episódio I de “Star Wars: A Ameaça Fantasma”.
Após muito tempo colecionando mortes em seu currículo de sangue, o cavaleiro decapitador foi finalmente pego numa emboscada e morto com um destino irônico, pois deceparam-lhe a cabeça, fato testemunhado por duas pequenas meninas que estavam nas proximidades. Seus restos mortais foram então enterrados numa floresta e o local de sua cova ficou conhecido como “A árvore dos mortos“, um verdadeiro portal entre o mundo externo e o inferno. Muitos anos se passaram e uma das meninas, já adulta, desenterrou o cavaleiro e roubou-lhe o crânio, incitando feitiçaria para trazer de volta do além o assassino em busca de sua cabeça, que agora estava sob o poder negro da moça. Ele é incitado a decapitar brutalmente os aldeões de uma pequena comunidade chamada “Sleepy Hollow”.
A moça, Lady Van Tassel
(interpretada por Miranda Richardson), está agora casada com um rico fazendeiro
da região, Baltus Van Tassel (Michael Gambon), e ela planeja matá-lo e às
principais personalidades do vilarejo para herdar fortunas e propriedades. Com
o crânio do cavaleiro sanguinário em suas mãos, ela controla e ordena seus
assassinatos, todos com requintes de crueldade e cabeças decepadas. Para ajudar
nas investigações das mortes, é então enviado um detetive de New York, Ichabod
Crane, o jovem interpretado por Johnny Depp num estilo Sherlock Holmes, que tem
a missão de desvendar a lenda do cavaleiro sem cabeça. Ele, ajudado pela jovem
Katrina Van Tassel (interpretada por Christina Ricci) e principalmente por um
garoto, órfão graças ao decapitador, consegue descobrir a trama sobrenatural e
ao devolver o crânio ao cavaleiro negro ele despacha-o novamente para o mundo
das trevas, levando consigo a moça que havia roubado sua cabeça.
São várias as cenas memoráveis
ao longo do filme, como a autópsia feita pelo detetive no cadáver de uma
senhora grávida, vítima do decapitador, onde um preciso corte no abdômen
denuncia também a decapitação do feto, e que deixou o jovem coberto de sangue
parecendo um açougueiro em um matadouro; os pesadelos do detetive ambientados
em sua infância, num momento onde ele entra em uma câmara de torturas e vê sua
mãe, Lady Crane (Lisa Marie), morrendo aprisionada em um brutal instrumento de
tortura da inquisição que rasgou toda a sua carne e dilacerou seu corpo em um
banho de sangue; a sequência do duelo entre o cavaleiro decapitador e um
corajoso jovem, Brom Van Brunt (interpretado por Casper Van Dien, de Tropas
Estelares, 97), onde após longa batalha de espadas, o vilão, manuseando duas
armas cortantes nas mãos com uma habilidade sobrenatural, esquarteja o jovem em
dois pedaços; o momento onde o detetive, procurando pistas sobre o local da
cova do cavaleiro sem cabeça, entra em contato com uma feiticeira da floresta
(na verdade, a irmã de Lady Van Tassel, que também testemunhou a morte do
vilão), a qual lhe revela a existência e o mapa da “árvore dos mortos” através
da possessão de um demônio; a cena onde o jovem Crane, de posse de um grande
machado, desfere vários golpes nas raízes da “árvore dos mortos” e a cada golpe
uma enorme golfada de sangue jorrava da árvore manchando a sua face; ou ainda a
sequência final da luta entre o cavaleiro sem cabeça e o detetive num moinho de
vento abandonado, numa clara referência ao clássico Frankenstein (31), onde
também na sequência final a criatura e o criador se confrontam mortalmente num
moinho idêntico.
(Juvenatrix - Maio 2000)
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